EMAG ABRE CURSO SOBRE DIREITO, GÊNERO E SEXUALIDADE

A EMAG abriu hoje, 16/10, o curso Direito, Gênero e Sexualidade, com a presença da presidente do TRF3, desembargadora federal Therezinha Cazerta; do diretor da escola, desembargador federal José Marcos Lunardelli; das juízas federais Célia Regina Ody Bernardes e Gabriela de Azevedo Campos Sales, coordenadoras do evento, e do juiz federal Emerson Couto.
O primeiro painel, Gênero, Sexualidade e Raça: Marcadores Sociais e Desigualdades, esteve sob a responsabilidade da antropóloga e professora associada da USP, Laura Moutinho. Em sua exposição, a palestrante destacou o conceito de interseccionalidade. Com base em Kimberle Crenshaw, bell hooks e Luiza Bairros, Moutinho explica que as mulheres negras experimentam às vezes a discriminação de modo similar ao experimentado pelas mulheres brancas; às vezes, elas partilham experiências similares às dos homens negros e às vezes a discriminação é vivida com base no gênero e na raça concomitantemente, como “mulheres negras”.
A antropóloga referiu-se à teoria ‘feminist standpoint’, segundo a qual, a experiência da opressão sexista é dada pela posição ocupada numa matriz de dominação onde raça, gênero e classe social se interceptam em diferentes pontos. Assim, uma mulher negra trabalhadora não é triplamente oprimida, mas experimenta a opressão a partir de um lugar que proporciona um ponto de vista diferente sobre o que é ser mulher numa sociedade desigual, racista e sexista. Essa posição pode ser mais bem compreendida através do lugar ocupado pelas empregadas domésticas.
Moutinho discutiu, ainda, a construção do “nós” e do “eles”, na produção da diferença e na estruturação dos Estados Nacionais e representações de nação, relacionando tais circunstâncias à concepção de sujeitos de direitos. Ao discorrer sobre a experiência brasileira e sul-africana, apontou que o ressentimento se constrói politicamente, gerando violência e que o caminho para escapar seria a ‘reinvenção de si’ e também o reconhecimento de minorias através de políticas públicas conduzidas pelo Estado. Ela citou como exemplo a desnecessidade de cirurgia para que uma pessoa transexual possa mudar de nome civil.
Já a juíza federal Jane Reis Gonçalves Pereira, professora associada da UERJ, conduziu o segundo painel, Gênero e Sexualidade: Entre o Público e o Privado. Com uma explicação didática sobre o que representam as categorias gênero, público e privado; a palestrante destacou a ainda existente assimetria de vozes entre homens e mulheres na esfera pública. Por meio de exemplos concretos, ela procurou mostrar como a falta de diversidade impacta o funcionamento das instituições jurídicas.
Com base na ideia de que “o pessoal também é político”, defendida por Susan Okin e outros teóricos, a magistrada ressaltou que o que acontece dentro das casas também é político: a divisão do trabalho doméstico, a relação com as crianças, daí a importância de existirem leis envolvendo direito de família, contra a violência doméstica, a discussão sobre o ‘home schooling’, a interrupção da gestação, métodos contraceptivos. A palestrante demonstrou, por meio de um gráfico, a predominância da presença masculina em todas as esferas da Justiça no Brasil. Na Justiça Federal, entre os magistrados, existem 73,8% de homens e 26,2% de mulheres. As promoções, seja por antiguidade ou merecimento, ainda contemplam, em sua maior parte, os homens. Em bancas de concurso na Justiça Federal, ainda há predominância da presença masculina, em todas as regiões. A magistrada citou ainda exemplos do que ocorre com as juízas em sabatinas; durante o uso da palavra nos órgãos colegiados, mencionando também estereótipos e ideias a respeito de reputação, tanto em nossos tribunais como nos estrangeiros. Ela citou o caso de Lady Hale, atual presidente da Suprema Corte no Reino Unido. Nomeada em 2004, ela foi a única mulher em 13 anos, em meio a 15 nomeações.
A magistrada chamou a atenção para o fato de que quando se pensa na figura de um juiz ideal, sempre nos lembramos de figuras masculinas construídas pelos teóricos, tais como Hércules, Júpiter ou Hermes. Citando Wangari Maathai, a última vencedora queniana do prêmio Nobel da Paz, Jane Reis colocou: “Quanto mais alto você for, menos mulheres haverá”.
O curso prosseguirá todos os dias, com novos painéis até 19/10, sempre a partir das 9h15.